Ou como o extremismo que tanto está em voga só rende argumentos pouco convincentes seja na Literatura, no Cinema ou na Televisão
Nos últimos meses ando
percebendo que as pessoas estão agindo de forma muito radical, tanto
no tête-a-tête do dia a dia quanto nas redes sociais. Qualquer que
seja o assunto, sempre há alguém que não se contenta com o meio
termo, expondo suas opiniões de forma extremada, sem medir palavras,
e pior, de caso pensado. Não há mais freio na forma como se
expressam – prova disso foi o ocorrido de semanas atrás, as
pessoas que bateram panela em suas janelas em protesto contra o
governo, xingando a presidente com palavras chulas, a maioria de
cunho sexual. Detalhe: provavelmente havia crianças acordadas,
testemunhando esse tremendo mau exemplo. Mas não é este o tema que
vou tratar neste texto. É um aproximado.
Há menos de um mês, a
TV Globo estreou uma nova novela das 21 horas, “Babilônia”.
Quase que imediatamente, várias pessoas passaram a promover nas
redes sociais uma campanha de boicote contra a produção televisiva,
dizendo que a história ofende “a moral e os bons costumes” da
“família brasileira”, e que o nome da novela faz referência ao
reino citado na Bíblia, governado pelo famigerado Nabucodonosor.
Bom, sempre que alguém levanta a bandeira da “moral e dos bons
costumes”, sei que só lerei e ouvirei comentários extremistas, polarizados. É
um tal de “não assisto mais novela, porque isso é pra mente
pequena”, “novela influencia as pessoas a se afastarem de Deus”,
e etc., que só mesmo pessoas (provavelmente) manipuláveis levam a sério. Não estou fazendo pouco da opinião
alheia; sou a favor de que a pessoa construa a sua própria,
mas com conhecimento de causa, para que possa encontrar um
meio termo. Meio termo, aliás, que não significa “ficar em cima
do muro” como alguns acreditam – é ver o tema sob o ponto de
vista imparcial, equilibrado. Se eu tenho críticas, e as tenho, devo conectá-las
ao contexto, para que essas críticas não reflitam pré-conceito(s)
que possa ter, porque pré-conceito, amigos, nada mais é que
criticar sem saber direito o que se está criticando. Assisto a
novela em questão, e não vejo NADA daquilo que tanto dizem que a
mesma tem. É até uma novela comum: tem a mocinha chata de galocha,
as vilãs que fazem qualquer coisa para se darem bem (como em
qualquer novela recente), o político que defende a “moral e os bons
costumes” mas é um pilantra de marca maior, e por aí vai. O
próprio nome da novela faz referência a uma favela carioca que
realmente existe e é até ponto turístico! Então, cadê o motivo? "Babilônia", caso queiram saber, chega a ser um tanto monótona em certos momentos. Apesar do tema instigante, sobre a ambição para o bem e para o mal, o texto se aproxima de "Celebridade", outra produção de Gilberto Braga na mesma emissora, onde quem chamava a atenção era a vilã. E o que tem demais nisso? Oscar Wilde compôs o protagonista de "O Retrato de Dorian Gray" para ser um homem sem moral, sem escrúpulos, mas sedutor de tal forma, que o leitor acabava torcendo por ele! E o que isso tem de ruim? Por que o extremismo? Só consigo pensar que quem critica a novela, é
porque possivelmente sequer a assistiu para construir um argumento convincente. Se
bem que polêmicas assim são muito comuns, acontecem com muita
frequência em qualquer campo, incluindo na
literatura e no cinema.
Um exemplo é Gustave
Flaubert, que publicou “Madame Bovary” em 1856. O romance tem
como peça central o oficial de saúde Charles Bovary e sua esposa
Emma, uma mulher bastante tola que, para fugir de sua vida monótona
– e do marido sem sal, na opinião dela, é claro – comete adultério. Hoje em dia, é de
comum acordo entre os críticos literários que a obra é a mais
célebre de Flaubert, mas caso isso fosse dito na época de sua
publicação, com certeza tal pessoa seria acusada de imoral. Isso, porque foi
exatamente o que aconteceu a Flaubert: o autor foi acusado de
escrever um romance obsceno, que ofendia “à moral pública e à
moral religiosa” (isso te lembra algo, leitor?) da sociedade de então. Alfred Pinard, o
advogado de acusação, afirmava que a obra não apresentava “nenhuma
gaze, nenhum véu, é a natureza em toda a sua nudez, em toda a sua
crueza!” (de novo, isso te lembra algo, leitor?), e a repercussão
do caso jogou Flaubert num escândalo nacional, e o autor, em sua
defesa, chegou a dizer que a personagem Emma Bovary não era ninguém
mais a não ser ele mesmo (“Madame Bovary c’est moi”, escreveu
o autor), e que o romance era nada mais que um alerta para os desvios
de uma mulher que se deixa levar por seus delírios românticos (ou, se for contextualizar para os dias atuais, uma pessoa que se deixa influenciar por enredos fictícios, escritos, filmados e televisionados, simplesmente porque acha a própria vida um marasmo). O autor foi inocentado, mas a cama já estava feita. "Madame Bovary" entrou para a história da Literatura como o romance que foi para o banco dos réus. Outro escritor que enfrentou problemas depois da publicação de um
romance foi Vladimir Nabokov, autor de “Lolita” – obra que até
hoje é acusada de apologia à pedofilia. José Saramago foi
excomungado pela Igreja Católica ao publicar “O Evangelho Segundo
Jesus Cristo”, e Dan Brown foi alvo de boicotes contra o seu “O
Código DaVinci”. No cinema, os alvos prediletos dos moralistas de
plantão eram Stanley Kubrick, diretor, dentre outros, de “Laranja
Mecânica” e "De Olhos Bem Fechados", e Pier Paolo Pasolini, de “Salò ou 120 dias de
Sodoma”. Todos eles sofreram com críticas parciais, extremistas,
de uma polarização absurda do tipo “ame-o ou deixe-o”,
exatamente como acontece atualmente com Gilberto Braga e sua telenovela
“Babilônia”. No entanto, a diferença entre essas produções e
a emissora global, é que as primeiras continham elementos realmente
polêmicos, enquanto que a última está sendo apedrejada como a Geni da música de Chico Buarque. É mesmo necessário
as pessoas se dedicarem tanto a uma causa tão sem sentido, quando há
outras muito mais coerentes e urgentes?
Sim, eu me pergunto se o
alvo não está trocado; afinal, se os promovedores de boicote se
ocupassem, por exemplo, a apoiar a greve dos professores da rede
pública de ensino de várias partes do país, em prol de uma
Educação Pública de qualidade, com a estrutura necessária para um
bom aprendizado, e o repasse das verbas que lhes são devidas, ao
invés de espalharem suas opiniões sem argumento crível contra
Gilberto Braga, talvez os objetivos dos educadores já teriam sido
alcançados. Tamanha paixão contra uma telenovela de história tão
comum deveria ser redirecionada a uma causa que valesse mais a pena.
Mas, como sempre, as pessoas gostam mesmo é de pão e circo...
... E isso é de uma mediocridade que espanta, principalmente quando é oriunda de pessoas que aparentemente deveriam ser mais esclarecidas. No fim, isso tudo mais parece polêmica de botequim transportada para outros meios, sabe Deus com qual verdadeira finalidade. Em outras palavras, a moda agora são as opiniões pilhas: polarizadas ao limite. Equilíbrio e imparcialidade mandaram lembranças.
... E isso é de uma mediocridade que espanta, principalmente quando é oriunda de pessoas que aparentemente deveriam ser mais esclarecidas. No fim, isso tudo mais parece polêmica de botequim transportada para outros meios, sabe Deus com qual verdadeira finalidade. Em outras palavras, a moda agora são as opiniões pilhas: polarizadas ao limite. Equilíbrio e imparcialidade mandaram lembranças.
Opiniões tipo pilha: sempre extremos, nunca equilibrados |
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